O Aeroporto Internacional de Florianópolis está movimentado. Pessoas vêm e vão. Passam argentinos em bando. Mães, de moletom, carregam crianças com uma mão e malas noutra. Uma multidão atravessa o portão de desembarque e, ao cruzar a passagem, se surpreende. O público puxa os telefones e começa a gravar o show de Baby do Brasil, no Tum Festival, que ocorreu no saguão do aeroporto, neste sábado (15).
É um rock que abre a apresentação. Mas as guitarras de Jean Pedroso e Nenel Lucena tocam acordes do período barroco. “Jesus Alegria dos Homens”, apresenta Baby ao público. “Não adianta me chamar de religiosa, que foi Bach quem batizou a composição.”
Em seguida, canta clássicos de seu repertório. No entanto, Baby, que é pastora evangélica, altera trechos das canções para que se adequem à sua religião. “Caetano Veloso não se incomodou porque botei ‘Jesus forever’ tatuado no braço”, diz a artista à Folha, sobre quando substituiu o “dragão” da letra de “Menino do Rio”.
A postura da artista é semelhante a de Claudia Leitte, que vem sendo criticada por substituir Iemanjá por Yeshua —Jesus em hebraico— na música “Caranguejo”, de 2004.
Baby repete o gesto em “Brasil Pandeiro”, de Assis Valente. “Não vou, como pastora, dizer que fui à Penha, fui pedir à padroeira. Tá amarrado e repreendido em nome de Jesus”. A “popstora” —como gosta de ser chamada— altera o trecho por “Eu fui pra igreja/ Pedir pra Jesus Cristo me abençoar.”
Mesmo assim, preserva o verso “Iluminais os terreiros” da canção popularizada pelos Novos Baianos. “Mas é terreiro de Jesus, meu filho. Não tô falando de terreiro de macumba. Terreiro é do meu Pai. Tambor é do meu Pai. Tudo é de Deus. Tomo tudo de volta. Tenho autoridade para tomar tudo de volta. E aí tomo mesmo. Sou ungida apóstola, por isso tenho essa autoridade”.
Mas Baby diz não aceitar preconceito, como canta em “Telúrica”. “Não tenho preconceito de nada. Nada. Realmente, não tenho. Tenho amor”, exclama.
“Tem que ter”, responde ao ser perguntada sobre discriminação contra evangélicos. “Pode-se falar da religião que quiser que não dá problema. Mas, quando se fala da crença que tem Jesus, o ‘Jesus forever’, os capetas se levantam todos e vira uma revolução. Você vê o mundo espiritual às claras. Não é uma coisa simples. Mas não sofro com nada disso, tenho compreensão de tudo.”
No Carnaval do ano passado, Baby viralizou ao alertar, em show de Ivete Sangalo, sobre a chegada do Apocalipse bíblico. “O arrebatamento tem tudo para acontecer entre cinco e dez anos. Procure o Senhor enquanto é possível achá-lo”, disse.
Um ano depois, a fala se transformará no trio elétrico “Os Arrebatados” em Salvador. O anúncio oficial deve sair em breve nas redes sociais da artista. Deverão ser quatro eventos ao longo do feriado.
Baby foi precursora em trios elétricos com cantores. “Não existia voz. Quem botou fui eu. Nasceu comigo”, relembra. Em 1976, os Novos Baianos, banda na qual a cantora iniciou sua carreira, estreou seu bloco. Na ocasião, gambiarras tecnológicas permitiram que vozes entrassem na geleia geral que embalava os foliões, tornando Baby a primeira mulher a cantar nesses carros de som.
“A repercussão da fala foi maravilhosa. Arrebatamento foi a palavra mais procurada no Google nos últimos tempos. Depois daquilo que aconteceu, em toda internet se fala de Apocalipse. Foi um avivamento.” A cantora diz amar Sangalo e que não existe conflito entre elas.
A pressão no camarim é intensa. Há pressa para que se conclua a entrevista porque Baby vai subir a BR-101 em direção a Balneário Camboriú. Ela vai ao Surreal, uma festa rave onde o DJ evangélico Renato Ratier, seu “irmão em cristo”, se apresentará. “Jesus te abençoe muito”, despede-se após quatro minutos de conversa.
noticia por : UOL