Um estudo conduzido nos Estados Unidos mostrou que a taxação de bebidas açucaradas, como refrigerantes e suco industrializados, ajuda a reduzir o IMC (índice de massa corporal) em jovens adultos. A pesquisa, realizada em cidades da Califórnia, destaca o impacto dessa política, que é discutida no Brasil com a criação do chamado “imposto do pecado”.
Publicado na Jama (Journal of the American Medical Association), o estudo acompanhou mais de 1 milhão de pessoas entre 20 e 65 anos, comparando cidades californianas que adotaram a taxação —Albany, Berkeley, Oakland e São Francisco— a outras sem o imposto. Os dados, coletados entre 2009 e 2020, mostraram quedas no IMC entre mulheres, jovens de 20 a 39 anos e indivíduos brancos.
O IMC foi calculado a partir de medições de peso e altura registradas em consultas médicas, considerando a média de várias medições ao longo de um ano para cada paciente. A classificação dos participantes seguiu os critérios padrão: sobrepeso (IMC entre 25 e 30) e obesidade (IMC acima de 30). O impacto não foi significativo na população em geral e na proporção de adultos com sobrepeso ou obesidade.
“As bebidas açucaradas são densas em calorias, mas pobres em nutrientes. Seu consumo pode levar a baixos níveis de saciedade, resultando em ingestão excessiva de calorias e ganho de peso”, explica o nutrólogo Marcelo Ferreira. Segundo ele, fatores como dieta geral e ambiente urbano também influenciam as taxas de obesidade.
Em Berkeley, onde 92% da receita arrecadada foi direcionada a programas de saúde, o consumo de bebidas adoçadas caiu 52% nos três primeiros anos após a implementação do imposto. Já em outras cidades analisadas, como Oakland e São Francisco, o impacto foi menor devido a diferenças na destinação dos recursos.
André Vianna, endocrinologista e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes, afirma que o estudo reforça as evidências científicas de que a taxação é uma estratégia eficaz para reduzir o consumo de bebidas açucaradas, uma vez que aumenta os preços ao consumidor. “Estratégias como campanhas educativas e restrições publicitárias também são importantes, mas têm um impacto menor”, afirma.
Uma projeção realizada na pesquisa sugere que um imposto de dois centavos por bebida poderia prevenir 266 mil casos de obesidade na Califórnia até 2032, com ganho de 114 mil anos de vida ajustados pela qualidade.
Cenário brasileiro
No Brasil, as bebidas açucaradas são responsáveis por cerca de 13 mil mortes anuais e por mais de 20% dos casos de obesidade infantil, segundo estudo da ACT Promoção da Saúde. Além disso, o SUS (Sistema Único de Saúde) gasta cerca de R$ 3 bilhões por ano no tratamento de doenças relacionadas ao consumo dessas bebidas.
A discussão sobre a taxação de produtos ultraprocessados, incluindo bebidas açucaradas, ganhou força como uma estratégia para combater o avanço da obesidade e de doenças crônicas associadas, como diabetes e hipertensão. A proposta, conhecida como “imposto do pecado”, está inserida na reforma tributária aprovada pelo Congresso em dezembro de 2023, que prevê a criação do Imposto Seletivo, substituindo o atual Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
A regulamentação do Imposto Seletivo ainda depende de legislações complementares, que devem ser discutidas ao longo de 2025. A previsão é que o novo imposto entre em vigor de forma gradual, com aplicação integral prevista para 2027. A legislação permite alíquotas variáveis conforme os níveis de açúcar adicionado às bebidas. “Essa medida pode ser um incentivo para que as empresas diminuam os teores de açúcar dos produtos, mantendo alíquotas mais baixas”, explica Luiz Carlos Junqueira, advogado especialista em direito tributário.
A taxação também é vista como uma ferramenta eficaz para reduzir o consumo e, consequentemente, os índices de obesidade e doenças crônicas. “Essas medidas desencorajam o consumo de produtos nocivos e ajudam a prevenir doenças como diabetes tipo 2, hipertensão e problemas cardiovasculares”, afirma Vianna. Segundo ele, políticas tributárias aliadas a campanhas educativas podem promover mudanças significativas.
No entanto, o sucesso da medida depende de uma abordagem integrada. O nutrólogo Marcelo Ferreira alerta que a taxação sozinha não resolverá problemas como a obesidade. “Pensando nutricionalmente, devemos priorizar a mudança do hábito como um todo. É importante diminuir o consumo de multiprocessados e equilibrar o de proteínas, carboidratos e gorduras”, diz.
O cenário atual reforça a necessidade de medidas efetivas. Projeções apresentadas no Congresso Internacional sobre Obesidade de 2024 indicam que, se nada for feito, quase metade dos adultos brasileiros terá obesidade até 2044. Atualmente, 56% da população adulta já convive com sobrepeso ou obesidade (34% e 22%, respectivamente).
noticia por : UOL