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Cuiaba - MT / 3 de março de 2025 - 19:46

Europa sem EUA consegue deter Rússia na guerra da Ucrânia?


Donald Trump parece não querer se envolver nas garantias de segurança para a Ucrânia. Mas será que a Europa pode preencher essa lacuna? Os EUA descartaram o envio de uma força da Otan para a Ucrânia
EPA via BBC
Donald Trump parece ter mais confiança na capacidade das forças armadas britânicas do que alguns dos próprios generais do país — ou, para ser mais preciso, muitos dos altos escalões militares aposentados.
Quando questionado durante a entrevista coletiva ao lado primeiro-ministro do Reino Unido sobre as garantias de segurança dos EUA para a Ucrânia, Trump disse: “Os britânicos têm soldados incríveis, militares incríveis, e eles podem cuidar de si mesmos.”
No entanto, o presidente dos Estados Unidos deixou no ar a questão sobre se os militares do Reino Unido poderiam de fato enfrentar a Rússia.
Em público, altos oficiais militares dos EUA são rápidos em elogiar o profissionalismo das forças armadas britânicas.
Mas, em particular, eles costumam criticar muito os cortes recentes no orçamento de defesa, especialmente no Exército Britânico, que agora tem pouco mais de 70 mil soldados regulares.
“Muito pequeno.” Essa foi a frase de um general americano sênior durante uma reunião privada em uma visita ao Reino Unido.
De acordo com o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, os gastos militares da Rússia agora são maiores do que os gastos totais com defesa de toda a Europa, em termos de poder de paridade de compra.
Os gastos russos aumentaram 41% e agora são equivalentes a 6,7% do PIB (Produto Interno Bruto) do país.
Em contraste, o Reino Unido gastará apenas 2,5% do PIB com defesa até 2027.
Os comentários do presidente Trump ressaltam o fato de que ele não pensa em colocar tropas americanas para operar no solo da Ucrânia para garantir um cessar-fogo.
Qualquer presença dos EUA no país será com fins econômicos, para explorar interesses de mineração.
O presidente americano sugere que isso, por si só, pode ser um impedimento para a Rússia atacar novamente.
Mas até mesmo o governo dele acha que deve haver alguma demonstração de poder duro também — fornecida por outros.
Caberá então às nações europeias fazer isso.
E a questão não é apenas se a Europa tem vontade de assumir esse papel: será que ela também tem números suficientes?
A resposta curta é não.
É por isso que Keir Starmer, o primeiro-ministro do Reino Unido, tem pressionado por garantias adicionais de segurança dos EUA, que detêm as forças armadas mais poderosas do mundo.
A Grã-Bretanha não está sozinha no movimento de cortar o investimento nas forças armadas após o fim da Guerra Fria.
Mas essa tendência começa a ser lentamente revertida na Europa, com cada vez mais nações ampliando os gastos com defesa.
E parte desse processo entrou em discussão neste domingo (2/3) em Londres, quando líderes de diversas nações europeias se reuniram para discutir o que fazer na guerra da Ucrânia e como garantir um tratado de paz (entenda mais abaixo).
Mas a Europa, por si só, não seria capaz de fornecer uma força de 100 mil a 200 mil soldados internacionais, que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky sugere que seriam necessárias para impedir um novo ataque da Rússia.
Em vez disso, autoridades do continente dizem pensar em uma força de até 30 mil soldados. Jatos e navios de guerra europeus também ajudariam a monitorar o espaço aéreo e as rotas de navegação da Ucrânia.
Essa força estaria focada em fornecer “segurança” em locais-chave — cidades, portos e usinas nucleares da Ucrânia.
Ela não seria colocada em nenhum lugar perto das atuais linhas de frente no leste da Ucrânia.
Jatos de caça e navios de guerra europeus também monitorariam o espaço aéreo e as rotas de navegação da Ucrânia.
O presidente ucraniano pede entre 100 mil e 200 mil soldados internacionais na Ucrânia
Getty Images via BBC
Mas essas mesmas autoridades reconhecem que esse contigente não seria suficiente, daí os apelos por uma espécie de garantia dos EUA — para “ter a confiança de que quaisquer forças que sejam mobilizadas não serão desafiadas pela Rússia” e “dar ao primeiro-ministro [do Reino Unido] a confiança de que ele pode mobilizar forças britânicas com segurança”.
As autoridades acreditam que, no mínimo, os EUA poderiam fornecer supervisão a quaisquer forças europeias com um “elemento de comando e controle” e caças americanos prontos para responder a partir de bases aéreas localizadas na Polônia e Romênia.
A Europa não pode igualar as capacidades de vigilância ou coleta de inteligência dos EUA.
Ela também poderia concordar em continuar a fornecer armas à Ucrânia.
Embora a Europa tenha ultrapassado recentemente os EUA em termos da proporção de armas fornecidas à Ucrânia, uma fonte garante que os EUA forneceram “o melhor” equipamento — como mísseis de longo alcance e sistemas de defesa aérea.
As nações europeias também não têm os facilitadores necessários para conduzir operações militares em larga escala por conta própria.
O fornecimento de armas à Ucrânia depende da logística dos EUA.
A campanha de bombardeio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) sobre a Líbia em 2011 também destacou deficiências do acordo — quando nações europeias supostamente assumiram a liderança da operação, mas se mostraram dependentes do apoio dos EUA.
Na ocasião, aliados precisaram de petroleiros de reabastecimento e sistemas que pertencem aos EUA.
Starmer acredita que ainda pode haver espaço para negociação com Trump
Reuters via BBC
Mas Keir Starmer parece ter deixado Washington na semana passada sem nenhuma garantia de apoio militar dos EUA.
Numa entrevista à BBC neste domingo (2/3), o Secretário de Saúde do Reino Unido, Wes Streeting, sugeriu que o novo compromisso de Donald Trump com o Artigo 5 da Otan — pelo qual um ataque a um aliado seria interpretado como um ataque a todos — poderia ser suficiente para uma ação americana mais contundente.
Mas o Secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, declarou anteriormente que quaisquer tropas internacionais enviadas à Ucrânia não representarão uma força da Otan, nem serão cobertas pelo tratado.
No momento, não há nenhuma garantia de segurança no estilo da Otan em relação ao conflito na Ucrânia.
A força de vontade da Europa é testada neste exato momento.
O primeiro-ministro, que convocou a reunião de líderes europeus neste fim de semana, logo descobrirá se as palavras calorosas de Donald Trump são suficientes para convencer outros a se juntarem ao Reino Unido em eventuais operações militares.
A França é a única outra grande potência europeia que até agora parece estar disposta a fazer o mesmo.
Algumas nações do norte da Europa — Dinamarca, Suécia e os Estados bálticos — também estão abertas a considerar um compromisso do tipo, mas novamente gostariam de garantias de segurança dos EUA.
Espanha, Itália e Alemanha por enquanto fazem oposição a uma ação dessas.
Starmer pode ainda acreditar que há espaço para negociação, que os EUA ainda podem estar dispostos a apoiar uma força europeia.
Mas e quanto à pergunta de Donald Trump? A Grã-Bretanha seria capaz de enfrentar o exército russo?
Mesmo que as forças russas tenham sido enfraquecidas, a resposta é não.
‘Estamos numa encruzilhada da História hoje’
Logo após a reunião com os líderes europeus, do Canadá e da Turquia neste domingo, Starmer concedeu uma entrevista coletiva em que detalhou um plano de ajuda à Ucrânia.
O primeiro-ministro disse que cada nação deve contribuir da melhor maneira possível, e todos devem aumentar a parcela de responsabilidade que assumiram.
Starmer detalhou que os líderes concordaram com quatro passos importantes durante a cúpula:
Manter a ajuda militar para a Ucrânia enquanto a guerra estiver em andamento e aumentar a pressão econômica sobre a Rússia;
Qualquer paz duradoura deve garantir a soberania e a segurança da Ucrânia, e a Ucrânia deve estar à mesa para quaisquer negociações de paz;
No caso de um acordo de paz, os líderes europeus tentarão impedir qualquer invasão futura da Rússia na Ucrânia;
Haverá uma “coalizão dos dispostos” para defender a Ucrânia e garantir a paz no país. Starmer detalhou que esse grupo pode incluir aliados de fora da Europa.
Starmer afirmou que o planejamento das ações será intensificado agora, diante da urgência dos fatos.
Ele também reafirmou o compromisso do Reino Unido em apoiar a Ucrânia com “botas no chão e aviões no ar”.
“A Europa deve fazer o trabalho pesado”, ele declarou.
Mas Starmer reforçou que um acordo precisa do apoio dos EUA.
“Deixe-me esclarecer, concordamos com Trump sobre a necessidade urgente de uma paz duradoura. Agora precisamos entregar [isso] juntos.”
Starmer ainda declarou que, durante a cúpula, os líderes concordaram em se reunir novamente em breve para “manter o ritmo por trás das ações” e continuar a trabalhar em direção a um plano compartilhado.
“Estamos em uma encruzilhada na História”, disse Starmer.
“Este não é um momento para mais conversas. É hora de agir e nos unir em torno de um novo plano para uma paz justa e duradoura”, concluiu ele.
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Fonte: G1

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